Este conteúdo é alojado pelo YouTube, e você não aceitou os nossos cookies funcionais, para puder aceder a este conteúdo pode alterar as suas definições de cookies e permitir os cookies funcionais.

Definições de Cookies

Rota do Bacalhau

O "fiel amigo"

O "fiel amigo"

Descoberto pelos Vikings, que o pescavam em abundância nos mares frios dos países nórdicos, em Portugal o bacalhau já foi considerado o “pão das marés” e é hoje conhecido como o “fiel amigo”.

A curiosa e longa relação deste país virado para o mar com um peixe seco que não é pescado na sua costa começa no século XIV, em tratados de comércio com a Inglaterra que previam a troca de sal por bacalhau.

Em meados de 1500, uma expedição dos Descobrimentos Portugueses a caminho da Índia descobre a Terra Nova e dá-se o início da pesca do bacalhau pelos portugueses. 

Rapidamente os pescadores nacionais viriam a ser expulsos por corsários ingleses e franceses, que detinham o domínio das pescas nessa área geográfica.

Durante vários séculos, este peixe foi um alimento exclusivo da Casa Real e da aristocracia, alastrando-se ao interior do país no século XIX pela sua facilidade de conservação e transporte.

Em 9 de Julho de 1920, a Companhia Portuguesa de Pesca é fundada por quatro pequenos armadores de pesca de arrasto, cada um proprietário de um navio. Instalando-se nas antigas instalações da Fábrica de Algodão da Companhia Lisbonense (antigo Convento de São Paulo) no Olho de Boi, em Almada, surgiu num contexto de expansão da indústria conserveira e piscatória.

Mas o consumo exponencial de bacalhau surge com o Estado Novo.

Até à data, Portugal importava a maior parte do bacalhau que consumia. As companhias piscatórias nacionais não funcionavam e o sector era desorganizado, irregular e com pouco investimento, e a população passava fome.

Para reduzir a dependência externa e garantir o abastecimento alimentar do país, Salazar centraliza a organização da pesca de bacalhau no Estado, fomenta a criação de cooperativas e carteliza o abastecimento. Surge assim a famosa Campanha do Bacalhau em 1934, que pretende tornar este peixe no alimento nacional.

Partindo de Belém, os bacalhoeiros eram lugres, barcos à vela e veleiros semi-motorizados, que levavam os dóris, pequenos barcos de madeira utilizados para a pesca à linha, e tinham capacidade para carregar entre 900 e 950 toneladas de bacalhau salgado.

Este tipo de pesca era um trabalho duro e perigoso. Os pescadores tinham de enfrentar o vento e a ondulação em alto mar, o perigo de embaterem num icebergue e o nevoeiro frequente. Muitos não conseguiam regressar para o bacalhoeiro e morriam em alto mar. A transição para a pesca de arrastão com barcos modernos foi tardia e lenta, o que eventualmente ditou a morte deste sector.

Durante a Segunda Guerra Mundial, Portugal manteve a sua atividade piscatória. Ao fazer a travessia do oceano Atlântico, os bacalhoeiros Maria de Gloria e Delães foram afundados por submarinos nazis. Um acordo com os Aliados viria a determinar que os navios bacalhoeiros portugueses deveriam ser pintados de branco para assinalar a neutralidade portuguesa no confronto de forma a circularem no Atlântico em segurança, ficando assim conhecidos como a “Frota Branca”.

O “Creoula”, lançado ao Tejo a 10 de Maio de 1937, foi utilizado entre esse ano e 1973 nas campanhas de pesca do bacalhau ao largo da Terra Nova e Gronelândia com um histórico de navegações que equivale a mais de vinte voltas ao mundo. Atualmente navio de instrução da Marinha Portuguesa é, juntamente com outros três lugres ex-bacalhoeiros - o "Santa Maria Manuela", o "Argus" e o "Gazela" - um dos últimos sobreviventes desta frota.

Após o conflito, a pesca do bacalhau torna-se um emblema do sistema corporativo e em 1957 Portugal é já o primeiro produtor mundial de bacalhau salgado seco, e o nível de substituição das importações aproxima-se dos 80%. Por esta altura, o trigo e o bacalhau eram os produtos que mais pesavam na estrutura alimentar e na balança comercial do país. 

Historicamente, o processo de cura do bacalhau começava nos bacalhoeiros, onde era imediatamente salgado. Ao chegar a terra, o peixe era lavado para remover todo o sal e secado para desidratar. A secagem do bacalhau era feita ao ar livre no Algarve, Margem Sul do Tejo, Setúbal, Figueira da Foz, Aveiro e Viana do Castelo. Era, geralmente, um trabalho feito por mulheres.

Com uma área de 360 hectares, as Salinas do Samouco em Alcochete foram, entre as décadas de 1930 e 1970, o principal centro salineiro da região de Lisboa. Daqui saía o sal em barcos para a salga do bacalhau, na distante Terra Nova, ou para os armazéns, no Cais do Sodré, para ser consumido na capital.

A Sociedade Nacional de Armadores de Bacalhau, uma das três fábricas de secagem e preparação de bacalhau que existiam em Alcochete e da qual resta hoje apenas o edifício, situava-se à entrada deste complexo.

1974 dita o último ano em que uma frota de bacalhoeiros partiu para a Terra Nova, o que coincide com a queda da ditadura em Portugal.

No entanto, hoje em dia continuamos a adorar bacalhau e diz-se que conhecemos 1001 maneiras diferentes de o cozinhar. Atualmente, 70% do bacalhau chega-nos da Noruega e os portugueses são responsáveis pelo consumo de 20% da captura mundial, à luz do consumo sustentável, das alterações climáticas e da sua versatilidade gastronómica.